segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Entrevista - Claudio Teixeira de Queiroz

Claudio Marcos Teixeira de Queiroz, 34 anos, é pesquisador, biomédico formado pela Unifesp com mestrado em Farmacologia e doutorado em Neurociências. Estudando/trabalhando já morou em Barcelona, atualmente reside em Amsterdã e está de mudança para Natal-RN.

FdM:Como foi que você escolheu fazer o curso que fez?

R: Parcialmente por acidente. Na época, pensei em prestar para Medicina (por causa da influência de meu pai, médico), História (por causa de um professor especialista em 2ª. Guerra Mundial) ou Música (por causa de uma banda de Heavy Metal da qual fazia parte). No último momento, minha namorada na época encontrou o curso de Biomedicina da Unifesp, descrito como uma profissão multidisciplinar e com grande enfoque em investigação científica. Preenchi o código do curso na mesa da inscrição da FUVEST sem saber exatamente o que aquela escolha realmente implicava. Felizmente a escolha do curso deu certo, não minha relação com a namorada.

FdM: Qual foi seu primeiro emprego na área e o que fazia?

R: Na carreira de pesquisador, a distinção entre emprego e estudo não é tão simples quanto para outras profissões. Digamos que minha primeira “recompensa financeira” apareceu quando estava no 3º ano da faculdade, quando recebi uma bolsa de Iniciação Científica. Depois da graduação, seguiram-se a bolsa para a realização do mestrado e depois do doutorado. De acordo com a legislação brasileira, bolsista é estudante e não um profissional (na maioria dos países europeus, os pós-graduandos são considerados profissionais, com todos os direitos trabalhistas assegurados). Durante o meu mestrado estudei os efeitos de drogas psicotrópicas no tratamento da esquizofrenia e durante meu doutorado, os mecanismos desencadeadores das epilepsias.

FdM: E daí como chegou onde está hoje?

R: Após terminar meu doutorado, busquei me inserir em alguns dos laboratórios de pesquisa acadêmica no Brasil. Visitei universidades (que são 99% das Instituições que fazem pesquisa no país) em Santa Maria (RS), Belo Horizonte (MG), Natal (RN) e São Paulo, cidade onde realizei os meus estudos. Problemas de origem política, acadêmica, pessoal e financeira acabaram me “empurrando” para o exterior (Amsterdam, Holanda), onde recebi uma proposta para trabalhar como pesquisador e onde estou no momento.

FdM: Conte como é sua rotina de trabalho (o que faz, que horas acorda, que roupa usa...)

R: A vida de pesquisador, no meu ponto de vista, é muito boa. Entretanto, convém ressaltar que muitos pesquisadores talvez tenham uma rotina de trabalho bastante diferente da minha. Ao contrário das outras profissões, meu trabalho me pertence, ou seja, o principal beneficiário de minha “mais valia” sou eu mesmo. Por isso, minha rotina é extremamente flexível. Levanto-me a hora que quero e trabalho o quanto quero. Não existe um código de vestuário e me visto de acordo com o clima. Minha rotina divide-se diferentemente ao longo do ano, consistindo basicamente da realização de experimentos, análise dos resultados e discussão em grupo, redação de manuscritos e apresentações em congressos e conferências. Apesar da grande liberdade de rotina, dificilmente trabalho menos de 10 horas por dia, todos os dias da semana. Por isso, costumo dizer que ser pesquisador não é uma profissão e sim um estado de espírito.

FdM: O que você mais gosta no seu trabalho? E o que mais se orgulha?

R: Fazer experimentos e descobrir coisas são seguramente os momentos mais preciosos do meu trabalho. Participar de congressos e conferências também é ótimo, pois é uma maneira de você conhecer o mundo e interagir com pessoas de diferentes culturas, uma vez que a linguagem da ciência é universal. Perceber que suas descobertas estão contribuindo para o desenvolvimento do conhecimento da humanidade é gratificante e ajuda a lustrar o ego. Entretanto, a idéia de contribuir para a melhoria na qualidade de vida de pessoas que sofrem com neuropatologias (em especial, as epilepsias) me parece um sonho digno de uma vida.

FdM: O que você menos gosta no seu trabalho?

R: O trabalho burocrático que sempre vem acompanhado de processo investigativo.

FdM: E na Faculdade, o que mais gostava e o que menos gostava?

R: O curso de Biomedicina na década de 90 era um curso bastante elitista, no sentido de que éramos poucos em classe (apenas 15) e tínhamos um envolvimento bastante íntimo com todos os professores das diferentes disciplinas. Isso possibilitou uma interação intensa e muito prazerosa entre todos, e muitas vezes tínhamos discussões sobre ciência e natureza, religião e sociedade, vida fora da terra e vida microscópica, tanto na sala de aula como na mesa do bar. Especialmente as aulas práticas de anatomia comparada (que era dada em um laboratório muito antigo cheio de animais empalhados), histologia (onde aprendi sobre o mundo microscópico), ecologia e evolução e biofísica (quando entendi porque o céu é azul) são as mais vívidas na minha memória hoje. Não gostava das avaliações e algumas disciplinas, que apesar de importantes para a minha formação, não me motivavam suficientemente.

FdM: O que um jovem que queira seguir uma carreira como a sua precisa ter?

R: Curiosidade e determinação. Se maravilhar com a natureza é relativamente fácil (quem já foi a Chapada Diamantina, ou assistiu documentários sobre a natureza sabe do que eu estou falando) e por esse motivo é muito fácil “se perder” na ciência. Por isso, acredito ser fundamental saber fazer as perguntas certas para obter respostas que sirvam para alguma coisa, caso contrário o cientista corre o risco de progressivamente se isolar em sua torre de marfim, se distanciando da sociedade e por fim da própria realidade por ele estudada.


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