sexta-feira, 21 de novembro de 2008

ME PEGO PENSANDO COMO

Por: Xico Sá

Como ela vem. Como está sendo o seu banho exatamente agora. Como ela ta cheirosa, mas que sue um tiquinho no camiño para dosar na conta, nossa! Como ela se olha no espelho na hora de se trocar. Como. Como ela fez o barulhinho do elástico da calcinha, pleft, a mais linda onomatopéias das moças. E nas vitrines da rua, como será aquela rápida mirada, extrato para simples conferência demasiadamente feminina. Como ela brigou com o cabelo hoje, porque em alguns dias os cabelos teimam em desobedecer às mulheres, sejam eles como forem. Como ela encarou o armário. Como enfiou a colher no papaia logo cedo antes de todas as acontecências. Como ela blasfemou contra o universo. Como ela disse “ai," ao teléfono, "mãe, num se preocupa, eu já estou grandinha”. Como os homens a olharam no percurso, que os homens do andaime não assobiem um “gostosa” hiperbólico, sob pena de ela se achar cheinha deveras, mas que assobiem alguma coisa, que não pequem por omissões – ah, não, são homens de verdade, não trabalham com elipses. Como ela deu aquela ajeitadinha nos peitos, agora já recuando para o começo das ações, o espelho. Como ela roçou um lábio no outro para corrigir o batom e dosar na maldade. Como ela decidiu por sandálias e não por sapatos ou tênis. Como ela pôs o rosto na janela para ouvir o homem do tempo. Como ela deu aquele saltinho na rua de moça feliz por hoje. Como ela achou que o celular tocava dentro da bolsa só porque eu pensava nela e não era nada pouco.

sábado, 15 de novembro de 2008

A campanha pela volta do cafuné continua

Por Xico Sá

Dos dengos femininos, ou historicamente femininos, o que mais nos faz falta, é o cafuné.

Nos dias avexados de hoje, não há mais tempo nem devoção para os delicados estalinhos no cocoruto do mancebo.

Pela volta imediata do mais nobre dos gestos de carinho e delicadeza. Nem que seja pago, como o sexo das belas raparigas dos lupanares, mas que devolvam vossas mãos às nossas cabeças.

Pela criação imediata da Casa de Cafunés Gilberto Freyre, como me propõe, em sociedade, a amiga Maria Eduarda Risoflora Belém. Ótima idéia a ser espalhada por todo o país. Milhares de casas, guichês, varandas, redes debaixo de coqueiros, sofás na rua... Tudo a serviço dos breves e deliciosos estalinhos dos dedos das moças.

Gilberto Freyre era um entusiasta do cafuné e a ele dedicou páginas e páginas. GF, aliás, escrevia como quem dá cafuné, prosa mole, ritmo dos mais sensoriais. Como também assenta palavras outro Freire, sem o estilingue do Y, o Marcelino de “Contos Negreiros”.

Que machos & fêmeas sejam treinados, em um programa social de emergência, para reaprenderem o hábito do cafuné.

Melhor: que seja feita uma campanha de saúde pública. Ah, quantas doenças de fundo nervoso seriam evitadas, quantos barracos de casais seriam esquecidos, quantos juízos agoniados seriam libertos!

Sem se falar no erotismo que desperta o dengo, como anotou outro sociólogo, o francês Roger Bastide, no seu belo ensaio “Psicanálise do Cafuné”. Pura libido.

Delícia de se sentir; beleza de se ver. O cafuné de uma mulher em outra, ave palavra!, puro cinema, para além muito além do lesbian chic.

Como era comum, na leseira de fim de tarde, nos quintais e nas calçadas.

Ao luar, então, sertões e agrestes adentro, era puro filme de Kurosawa. O resto era silêncio.

Ai que preguiça boa danada, ai que arrepio no cangote, quero de volta meus cafunés.

Viver de brisa, como na receita de Bandeira, numa rede na rua da Aurora, sob a graça dos dedos de uma morena jambo ou de uma morena caldo-de-feijão.

Como pode uma criatura, como esses rapazes de hoje, passarem pela vida sem provar do êxtase de um cafuné?

Pela obrigatoriedade do cafuné nos recreios escolares, nas missas, nos cultos, nos intervalos dos jogos de qualquer esporte.

Não é possível que se condene toda uma geração a viver sem cafuné. Eis uma questão de segurança nacional. Tão importante como aprender a assinar o próprio nome. O cafuné, aliás, é a assinatura em linda e barroca caligrafia de mulher.

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

DA ESPIONAGEM AMOROSA & OUTRAS INVASÕES BÁRBARAS

Crônica publicada em 10/11/08 no Carapuceiro

Por: Xico Sá


A amiga M. conta que, mais uma vez, caiu na tentação de fazer uma rápida espionagem no telefone do mancebo.

Quem manda!

Quem procura, acha, como grita o adágio popular mais óbvio.

Aproveitou o banho do condenado para ver, pelo menos, as últimas mensagens de texto.

Maldita caixa de entrada.

Claro que encontrou merda, com licença da palavra, mas foi essa a descarga de inevitável léxico –que outro vocábulo poderia usar nesta fatídica hora?- a preferida para o desabafo a este cronista e conselheiro das moças.

Encurralado, o miserável já havia dito que ficara com outra donzela.

Nada demais, só uns beijos, disse o réu confesso diante das provas incontestáveis. Hoje uma fotinha digital, enviada anonimamente por e-mail, vale por mil cartas anônimas de antigamente.

O infeliz das costas ocas, o lazarento, o febre-do-rato, o cabra safado –aqui reproduzo fielmente o rosário de adjetivos usado por minha amiga traída- aproveitou um desses carnavais fora de época para a famosa prática do pulo à cerca, o mais olímpico e familiar dos esportes brasileiros.

Um homem picareta e uma folia de micareta, definitavamente, não rimam com fidelidade e amor.

A amiga M., porém, já sabia com quem lidava, idiota quem acha que é tarefa fácil engambelar uma fêmea. Não que o moço fosse de tudo um canalha legítimo, era apenas um homem, ainda um amador nessa arte.

O que incomodou mesmo a colega foi a falta de criatividade do desalmado. O filho de uma rapariga havia escrito para a nova presa a mesmíssima coisa que rabiscara mal e porcamente na mensagem com destino à doce M.

Tudo bem, não era nada genial, mas uma frase comovida, dizendo quão bela fora a primeira noite dos dois juntos. Sim, porque é ridículo que um macho e uma fêmea, chabadabadá, como diz a trilha daquele famoso filme de Claude Lelouch (“Um homem, uma mulher, 20 anos depois”, em todas as locadoras do ramo), se locupletem na cama e o silêncio torne irrespirável o dia seguinte.

É preciso, é necessário, e deveria constar da Declaração dos Direitos Universais do Homem, que se diga pelo menos uma coisinha, um agrado, SMS, um mimo, ainda sob o sol que se levanta muito antes dos dois. Não estamos falando em casamentos ou outros laços duradouros, amigo, é questão de educação e delicadeza, simplesmente um carinho depois de tanta intimidade.

O que chateou a amiga, de modo a doer-lhe no fígado, foi que o mal-assombro dela usou as mesmas palavras que mandou para a “vagabunda”.

Claro que o ciúme não é apenas do plágio, da cópia automática, mas isso prova como os homens, além de frouxos para encarar os romances, andam sem a menor criatividade. Gente que gasta a maior lábia para os negócios e os projetos culturais –caso do mancebo sob o tiro ao alvo desta crônica- é incapaz de variar em duas linhas para uma mulher honesta, digo, para uma mulher que presta!

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Gabarito - simulado interno 3º ano

1 e
2 a
3 e
4 a

Gabarito - simulado interno 2º ano

1 d
2 c
3 c
4 a

Simulado interno 1º ano - gabarito

1 d
2 b
3 d
4 a

terça-feira, 4 de novembro de 2008

A hora de dizer "eu te amo"

DO AMOR E DOS SEUS PRONUNCIAMENTOS

Por Xico Sá

Amigo, se você é do tipo que diz “eu te amo” de uma forma, digamos assim, precoce e irresponsável, na afoiteza das primeiras e belas noites na alcova, como já tanto o fez este pusilânime cronista, prepare o seu coração pras coisas que eu vou contar, digo, “se liga”, como verbalizam os avexados mancebos da hora.

Se a gazela for safa,sábia, mal algum há em tal pronúncia, até apreciará o empolgante anúncio como uma poesia de fundo, como se uma música de Sérge Gainsbourg –Je t'aime moi non plus- estivesse tocando no quarto de motel barato àquela altura.

Pensará a moça, bem baixinho, “que doce vagabundo”. Terá sido apenas um pequeno crime, como num bolero, um “besame mucho”, um cha-cha-cha num Caribe imaginário, cortinas ao vento, lua caliente lá fora, barulho de caminhões no asfalto.

Sim, a gazela pode entender como um “eu te amo mesmo, de verdade, verdadeira, assim como Deus sobre todas as coisas”.

Que mal há nisso?

Quantos amores à vera começaram com um “eu te amo” de brincadeira?

Nesses tempos de amores líquidos, de amores ficantes, de amores-vinhetas de 15 segundos, quem saberá o que venha a ser o amor patenteado pelos deuses incas ou gregos?!

O melhor mesmo é dizer, sem medo, eu te amo, e honrá-lo pelo menos enquanto o sublime eco resistir entre aquelas abençoadas quatro paredes.

E se ela acreditar, ora, ora, manda um “eu te amo, meeeesssmmmoooo”.

Com olhinhos revirados, vamos mais fundo ainda: “Eu te amo até o fim dos tempos”.

Se ela não tá nem aí, você se vira para o piano e ordena, como no filme Casablanca, mesmo que estejam atravessando a avenida Afonso Penna em Belo Horizonte, seis horas da tarde, buzinaço, hora do ângelus: “play, again, Sam!”

E manda mais “eu te amo”, como um estribilho do vento, nas oiças da desalmada, até ela acostumar com a natureza humana do macho que veio ao mundo com um cowboy solitário que tem apenas um mantra, uma bala no coldre dos sentimentos: “eu te amo”.

Monocórdico sr. das sombras cujo cardiograma é um terremoto de “eu te amos”, como um sismógrafo nervoso a riscar o mostrador da maquininha que mede os tremores demasiadamente humanos de todos os cardiologistas particulares.

Antes um “serial lover” a dizer eu te amo como um cuco desembestado a um elíptico e silencioso cabra safado que guarda os “eu te amo” para a hora do chifre ou para a extrema-unção, como meu amigo “mucho macho” que morreu balbuciando, câmera lenta, para o padre Cristiano, lá em Santana do Cariri, muito tempo atrás: “padre, me perdoa, estou morrendo, creio, e nunca disse eu te amo!”. Donde a dúbia e indecifrável sentença guarda dúvida até hoje: “para quem seria aquele guardadíssimo eu te amo?”. Para o padre ou para o seu amor proibido?

Donde baixa um Esopo fabulador para deixar a moral da crônica: mais vale um “eu te amo” que entre por um ouvido e saia pelo outro do que um silêncio mortal de um homem que nunca se empolga e deixa a gazela achando que “eu te amo” é coisa só de novela e de filme americano.