sábado, 18 de setembro de 2010

Negócio aponta novo protagonista global

Publicado na FSP em 03/09/10


Expansão da economia brasileira cria classe de prósperos empreendedores sem medo de investir fora do país

Muitos dos novos ricos brasileiros são pessoas de origem mais rústica, seguindo um modelo familiar aos americanos



LARRY ROHTER
DO "NEW YORK TIMES"

A oferta de aquisição do Burger King apresentada ontem por um grupo de investimento de capital brasileiro, assim como a aquisição da Anheuser-Busch (há dois anos e envolvendo alguns dos mesmos investidores), é uma dessas transações emblemáticas que parecem simbolizar o surgimento de um novo protagonista nos negócios mundiais.
Mas isso era previsível já há um bom tempo. O crescimento da economia brasileira nos últimos anos criou toda uma classe de prósperos empreendedores em busca de oportunidades de investir suas fortunas e que não se deixam assustar pela ideia de tentar a sorte além das fronteiras brasileiras.
Tradicionalmente, os negócios brasileiros sempre foram dominados por uma elite muitas vezes cautelosa, radicada em São Paulo, o polo industrial e financeiro do país. Mas a disparada econômica dos dez últimos anos mudou o quadro.
Segundo o Boston Consulting Group, entre 2006 e 2008 o número de milionários brasileiros subiu em quase 70%, de 130 mil para 220 mil. É um dado estatístico notável.
Com cerca de um sexto da população da Índia, outro membro dos Brics, o Brasil abriga mais milionários que o país asiático. E o clube dos bilionários, ainda mais exclusivo, também vem crescendo em ritmo sem precedentes no Brasil.
Jorge Paulo Lehman, figura importante na aquisição da Anheuser-Bush e na oferta pelo Burger King, é um executivo de investimento bem preparado, educado em Harvard, filho de imigrantes suíços. Mas muitos dos novos ricos brasileiros são pessoas de origens mais rústicas e enriqueceram depois de começar a vida humildemente, seguindo um modelo bastante familiar aos americanos.
A companhia de aviação TAM, que em agosto anunciou fusão com a LAN Chile e se tornará a maior empresa do setor na América Latina, foi criada nos anos 70 como uma modesta empresa de carga aérea.
A força propulsora no caso da TAM foi Rolim Amaro, um antigo piloto de origem humilde e que comandou a empresa de maneira ousada e astuta até morrer em acidente de helicóptero em 2001.

FRIBOI
Mas talvez o mais intrigante e dinâmico dos novos empresários brasileiros seja Joesley Batista, que começou a trabalhar ainda menino no açougue do pai, em Goiás, e hoje comanda a JBS-Friboi, a maior empresa global de processamento de carne.
Quando o Brasil passou por uma crise cambial, em 1998 e no começo de 1999, Batista e seus irmãos entenderam o momento não como ameaça, e sim como oportunidade de ganhar o mercado de exportações, e obtiveram empréstimos no BNDES para colocar a ideia em prática.
Capital adicional foi levantado por uma oferta pública inicial de ações e, em 2007, a JBS-Friboi tomou o controle da Swift, outra marca americana conhecida. Em 2009, acrescentaram a Pilgrim's Pride à sua lista, e isso ajudou sua empresa a superar a Tyson Foods e chegar à liderança no mercado mundial de processamento de carne.
Além disso, o hoje bilionário Joesley Batista afirmou que superar a Tyson Foods era apenas "o primeiro passo" de uma estratégia mais ampla que envolve fazer da JBS-Friboi uma potência também no ramo de leite e laticínios. Com isso, como prever o que pode acontecer?
Uma coisa fica clara, no entanto: o domínio brasileiro sobre todas as etapas do setor mundial de carne. O país já é o maior exportador mundial de carne bovina e agora, com a oferta pelo Burger King, disporá de mais um veículo para encorajar o consumo em todo o mundo.
Isso é que é sinergia.

Brics serão gigantes de renda média

Publicado na FSP em 16/08/10


Economias de Brasil, Rússia, Índia e China alcançarão as do G7, mas diferença em PIB per capita permanecerá grande

Mudança no ranking de maiores economias terá importantes impactos geopolíticos, de acordo com especialistas

DE SÃO PAULO

Somadas, as economias dos Brics alcançarão as do G7 em 2032, e a distância entre os dois grupos crescerá em anos subsequentes. Mas a renda per capita média de Brasil, Rússia, Índia e China ainda será o equivalente a quase um terço da dos sete países industrializados em 22 anos.
Segundo projeções do Goldman Sachs, a renda per capita média dos Brics será US$ 21,57 mil em 2032, ante US$ 58,24 mil do G7 (EUA, Reino Unido, Japão, Itália, Alemanha, França e Canadá). Historicamente, essa será uma situação inédita.
A Rússia será o único Bric de renda alta, US$ 39,23 mil, ainda assim inferior à média do G7. China e Brasil (com cerca de US$ 20 mil de renda per capita) serão nações de renda média. E a Índia, com PIB (produto interno bruto) per capita de US$ 5.500, permanecerá pobre.
De acordo com economistas ouvidos pela Folha, essa nova configuração da ordem mundial terá impactos geopolíticos importantes que afetarão cada vez mais a agenda política e econômica global.
Os tópicos de discussão, resumidos abaixo, vão do futuro do G7 e do papel dos Brics nas instituições multilaterais à atratividade do modelo econômico chinês.

G7 versus G20
O chamado G20 (grupo que reúne países desenvolvidos e emergentes de grande peso econômico) provavelmente substituirá o G7 como principal fórum de debate e decisões políticas e econômicas.
"Acho que a vantagem do G20 é que é um grupo global que inclui mercados emergentes que crescem a ritmo rápido", diz Anoop Singh, diretor do departamento da Ásia do FMI.
Instituições multilaterais Para Singh, os emergentes terão peso crescente nas instituições multilaterais.
Mas, de acordo com Jim O'Neill, economista-chefe do Goldman Sachs, isso levará a um debate complexo: "Quem vai pagar pelo FMI? Serão as economias maiores, aquelas com mais reservas internacionais ou os mais ricos?".
Modelo chinês Segundo Arthur Carvalho, economista-chefe da Ativa Corretora, um tema que será muito debatido é a atratividade do modelo econômico chinês, de economia capitalista, aberta, mas com forte planejamento do governo.
Esse foi o tópico do debate da semana passada promovido pela "Economist" em seu site. A pergunta proposta pela revista britânica era se a China oferecia um modelo de desenvolvimento melhor que o do Ocidente. Até a sexta-feira passada, a maioria dos leitores respondeu que não (58% ante 42%).
Risco de conflito O economista Eduardo Giannetti da Fonseca, professor do Insper, diz não acreditar que se formará uma nova hegemonia política e econômica em torno da China, que, segundo projeções do Goldman Sachs, ultrapassará os EUA como maior economia do mundo em 2027.
Mas vê o risco de conflitos econômicos entre a China e outras grandes potências, à medida que o país asiático expandirá a ritmo cada vez mais rápido sua presença e sua influência em outras partes do mundo, principalmente nos países pobres e em desenvolvimento.
(ÉRICA FRAGA)